Durante
o percurso histórico dos surdos, percebemos o quanto este povo lutou e ainda
luta para obter seu reconhecimento perante a sociedade. As marcas que ficaram
registradas nas raízes do passado emocionam, como a luta pela própria
sobrevivência de um povo que não tinha os mesmos direitos que o restante da
população, eram marginalizados, vistos como incapazes de pensar, ou de realizar
outras atividades simples que faziam parte do convívio social.
Ao
estudarmos a história mais a fundo vemos atrocidades que eram cometidas contra
pessoas que nasciam surdas. Na antiguidade, em algumas regiões os surdos eram
lançados de penhascos sendo oferecidos a sacrifício aos Deuses, os romanos não
os aceitavam dizendo que eram imperfeitos. Ou seja, os surdos eram tratados
como seres que apresentavam algum tipo de déficit de Inteligência, eram
considerados inválidos e, em muitos casos condenados a morte.
Com
o passar do tempo foram surgindo pessoas que apresentavam um olhar diferente em
relação a este pensamento muitas vezes desumano. De acordo com os registros de
pesquisadores, na Idade Média em 700 d.C, John Beverley foi o primeiro a
ensinar uma pessoa surda falar. Já o espanhol Pedro Pance de León, um monge
beneditino fundou uma escola para surdos e desenvolveu o alfabeto manual, em
outro momento, Juan Pablo Bonet um padre espanhol continuou o trabalho de León,
ensinando os surdos a lerem e a falarem, utilizando o método oral. Já John
Bulwer um médico britânico, defendia o uso de gestos entre os portadores de
surdez. A mudança foi sendo aprofundada quando os nobres que tinham filhos
surdos, preocupados com a exclusão dos mesmos diante da sociedade, passaram a procurar
estes estudiosos para auxiliá-los. Era necessário nesta época que o surdo
aprendesse a falar, ler, escrever, compreendesse a doutrina católica, pois,
estes fatos implicavam no reconhecimento do surdo como um cidadão e por
consequência no seu direito de receber a herança e título da família. Partindo
desse pressuposto de que o surdo teria que falar para ser humanizado, outros
defensores do mesmo pensamento foram surgindo.
Neste
momento percebemos que a visão sobre o surdo começa a seguir para outro rumo e,
por volta do século XV observamos que a Educação de Surdos era tratada como
caso patológico passível de ser curada. Os médicos desta época passam a estudar
este assunto mais a fundo, alguns profissionais estavam realmente engajados em
descobrir uma cura, muitos interessados nesta causa tinha algum parente surdo.
A
partir do séc. XX, os portadores de deficiências passam a ser vistos como
cidadãos com direitos e deveres de participação na sociedade. No início
acreditavam que a melhor forma de educar os surdos era pela oralização, já que
a sociedade se comunica desta forma, neste período os gestos praticados pelos
surdos para se comunicarem deveriam ser banidos. Muitos surdos que não tinham
acesso aos “métodos educacionais” e não apresentavam um convívio aberto com
familiares não aprendiam a se comunicar pela oralização, ou seja, não podiam
falar. Durante o oralismo o surdo era tratado como Surdo-mudo, ou muitas vezes
a forma mais comum era apenas Mudo.
Podemos
observar que atualmente nossa sociedade carrega essa herança cultural, onde
muitas pessoas utilizam a nomenclatura surdo-mudo ou apenas mudo de forma
errônea, a maioria dos ouvintes desconhece a carga semântica que os termos,
surdo-mudo, mudo e deficiente auditivo carregam. Para muitos ouvintes o uso da
palavra surdo parece demonstrar preconceito, vemos que o sentimento de culpa e
de discriminação determinou o termo conhecido como deficiente auditivo, sendo o
mais correto a se referir às pessoas surdas.
A
partir deste momento nos deparamos com este impasse, surdo, surdo-mudo ou
deficiente Auditivo, qual é a melhor terminologia para nos reportarmos a este
povo?
Podemos
afirmar que o fato de uma pessoa ser surda não significa que ela seja muda,
pois, de acordo com vários estudos de médicos e educadores, os mesmos chegaram
a uma conclusão que o aparelho fonador do surdo assim como dos ouvintes estavam
preservados, neste sentido o termo surdo-mudo não é aceitável.
Mudo
é todo o individuo que não faz uso de seu aparelho fonador para a fala ou
qualquer outra manifestação vocal. Algumas pessoas podem apresentar mudez como
um sintoma de sua alteração psíquica, ou ainda devido um câncer na laringe,
onde é realizada uma cirurgia para a retirada do órgão responsável pela
reprodução sonora da fala, porém, se tornarão mudos temporariamente, pois,
podem reaprender a falar utilizando a voz esofágica (produzida pelo esôfago).
Se o indivíduo não apresenta alterações psíquicas e nem orgânicas que possam
interferir em sua fala, logo podemos afirmar que o surdo é capaz de produzir
sonorização vocal, sendo possível balbuciar e, além disso, podem desenvolver a
linguagem oral por meio de um processo terapêutico
fonoaudiológico. Concluímos que não é correto dizer que todo surdo ou
deficiente auditivo é mudo. Com a convivência com eles iremos perceber que
podem falar e se manifestar através de sons da fala. É importante ressaltar que
muitas pessoas surdas não falam porque não aprenderam a falar, não tiveram a
oportunidade ou optaram por não serem oralizados.
Muitas
pessoas também confundem surdez com deficiência auditiva, ou preferem utilizar
apenas utilizar o segundo termo. Acreditam que a deficiência se refere à
incapacidade, acham que a pessoa será dependente o resto de sua vida, não será
capaz de conviver socialmente ou de ter hábitos “normais”. Entretanto, se
utilizado sem o sentido discriminatório, a nomenclatura deficiente auditivo não
está errada, visto que ela é um déficit adquirido, ou seja, é quando se nasce
com uma audição perfeita e, devido a lesões ou doenças acaba acarretando na
perda da audição. Nestas condições muitas pessoas já aprenderam a se comunicar
oralmente. Em determinados casos pode-se recorrer ao uso de aparelhos auditivos
ou a intervenções cirúrgicas, tudo depende do grau da deficiência auditiva, tendo
como objetivo de minimizar ou corrigir o problema.
Por sua vez, a surdez é de origem congênita, ou seja, o indivíduo nasce surdo, isto é, não se tem a capacidade de ouvir nenhum som. Nestes casos, surge certa dificuldade no desenvolvimento da comunicação, ou seja, na aquisição da linguagem, mas nada impede que o indivíduo possa se desenvolver socialmente. Podemos desta forma também utilizar o termo surdo, sem medo algum de achar que estamos sendo ofensivos.
Sabemos
de fato que a audição assim como o restante dos sentidos é de extrema
importância para o nosso desenvolvimento cidadão, como um ser de direitos e
deveres perante a sociedade. A audição é o primeiro sentido a ser apurado pela
intermediação do convívio com o âmbito familiar, através dela passamos a
conhecer o mundo que nos rodeia, ouvimos os sons que o mundo emite. É graças a
ela que nós ouvintes nos comunicamos com o mundo, desenvolvemos nossa
identidade, nossos sentimentos, passamos a compreender todas as relações que
nos cercam, todos os vínculos sociais e expressamos de forma eficaz nossos
desejos.
O
surdo, mesmo que seja privado em um dos sentidos, é capaz de interagir e
aprender, criar e se comunicar. Ele pode estabelecer esta conexão com o mundo
através do desenvolvimento de seus outros sentidos, os olhos são para o surdo o
que os ouvidos são para os ouvintes, a língua de sinais é uma forma de
expressão corresponde a sua voz. Cabe aos educadores, estabelecerem
possibilidades que irão contribuir com a inclusão do surdo, pois, o mundo não
pertence exclusivamente aos ouvintes, todos possuem os mesmos direitos. “o surdo é diferente, não deficiente”, as
diferenças existem, e com elas devemos aprender que ninguém é melhor ou pior
que o outro, somos todos iguais independentes de nossas características físicas
ou culturais.